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Os adultos na sala

“É, aliás, imperativo que PS e PSD se entendam noutras matérias, como a reforma da justiça, a reabilitação do SNS ou a resolução dos problemas na Educação. É assim nas democracias mais sólidas, assim deve ser em Portugal.”

João Mendes

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Durante a campanha eleitoral, Pedro Nuno Santos e André Ventura assumiram posturas diferentes face a um cenário de vitória da AD, que se confirmou.

Pedro Nuno Santos, por seu lado, apresentou-se como alternativa ao projecto político encabeçado por Luís Montenegro.

Já André Ventura passou a campanha a falar na necessidade de entendimentos à direita. E a exigir um lugar à mesa da governação.

Ambas as opções eram e são legítimas. Como era o “não é não” de Luís Montenegro, independentemente de o considerarmos fruto da convicção ou do tacticismo político.

Contados os votos, e apesar da diferença residual entre AD e PS, cabe agora à coligação de direita governar o país. E aos portugueses escrutinar o seu trabalho, bem como o trabalho da oposição.

O primeiro teste do algodão à postura e responsabilidade dos novos actores políticos aconteceu durante a primeira sessão parlamentar. Apesar de ter assumido publicamente que o seu partido votaria no candidato apresentado pelo PSD para presidir à Assembleia da República, afirmando mesmo ter um acordo com a AD, Ventura roeu a corda no último instante e os seus deputados votaram contra a eleição de Aguiar Branco.

Devido a diferenças insanáveis do ponto de vista ideológico ou político?

Nada disso.

Porque José Pedro Aguiar Branco é uma personagem sinistra e o CH quis afastar-se dela?
Também não.

Como mais tarde clarificou o deputado João Tilly, do CH, o chumbo de Aguiar Branco mais não foi que uma demonstração de força do partido de André Ventura. De onde se conclui que foi o interesse do próprio Ventura, não o interesse nacional, que esteve na base da posição assumida pelo grupo parlamentar do CH.

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De onde se conclui, também, que o CH não é um partido confiável.

No dia seguinte, perante o impasse, os adultos na sala decidiram sentar-se à mesa para encontrar uma solução. E encontraram-na. O PS garantiu a eleição de Aguiar Branco e a AD aceitou dividir a presidência da AR, pese embora as dúvidas que ainda subsistem sobre a capacidade de um governo minoritário resistir até ao final da Legislatura.

Já André Ventura deu seguimento à sua narrativa, destinada à criação de conteúdos para as redes sociais: o “sistema” entendeu-se.

Foi sempre essa a sua intenção. Ventura nunca pretendeu entender-se com a AD. Quis, isso sim, criar condições para se vitimizar e gritar contra o tal “sistema”, à mesa do qual tanto mendigou por um lugar.

O “sistema”, é bom que tenhamos presente, chama-se democracia liberal. É, até à data, o melhor que a humanidade foi capaz de conceber. O que mais prosperidade e bem-estar gerou para mais pessoas. E sim, é normal que os diferentes partidos coloquem de lado as suas diferenças e se entendam num conjunto de matérias, incluindo a eleição de figuras de Estado que pouco ou nada influenciam a governação, ou o papel legislativo da Assembleia da República.

É, aliás, imperativo que PS e PSD se entendam noutras matérias, como a reforma da justiça, a reabilitação do SNS ou a resolução dos problemas na Educação. É assim nas democracias mais sólidas, assim deve ser em Portugal.

Já o papel do CH é outro: minar a credibilidade da democracia liberal, à qual se opõe abertamente, tal como se opõem os seus pares na Hungria, em Itália ou em França, enquanto defendem os interesses de Moscovo no Conselho Europeu, envergam t-shirts com a cara de Vladimir Putin e afixam cartazes pagos com os rublos que lhes chegam directamente do Kremlin.

A defesa da democracia liberal é o grande combate dos nossos tempos. E se houve um tempo em que achávamos que Portugal estaria a salvo das convulsões que ameaçam as suas fundações, em Washington como em Berlim, a chegada em força das tropas de André Ventura ao Parlamento, com a sua postura irresponsável e incendiária, é um alerta para a urgência de defender as instituições democráticas e tudo o que elas nos deram e representam. Que os adultos na sala saibam estar à altura desse nosso património comum.

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