Edição 581
Literária mente
A personagem.
Os escritores funcionam como deuses. Criam um verdadeiro mundo, não só físico, como também ao nível humano. Estranho inserir as personagens no grupo “humano”, mas é a mais pura das verdades. Se elas forem bem construídas, quase que parecem pessoas reais.
É importante que as personagens das histórias que escrevemos pareçam verossímeis, que pareçam ser pessoas de carne e osso, que poderíamos conhecer na escola, na rua, num café. Mesmo quando falamos de criaturas sobrenaturais, é com as suas características mais humanas que o leitor se identifica. E, no fundo, é essa – ou deveria ser – a principal função de um livro: tocar o leitor, fazer o leitor sentir.
Não são raras as situações em que uma personagem é quase sinónimo da história inteira. Pelo seu papel, pela sua importância, acaba por se associar facilmente ao nome da história. Pensemos em Harry Potter, por exemplo. Vamos associar, para sempre, o ator à personagem. E quando pensamos na história, até porque é homónima, pensamos, primeiramente, sempre nele. A personagem principal, o herói da história, é, na maioria das vezes, aquele em quem nos inspiramos, aquele que sonhamos ser, aquele cujas qualidades gostaríamos de emular. Queremos vê-lo ser bem-sucedido, queremos que seja feliz e sofremos quando cai, a dor dele é a nossa dor e fazemos figas durante todo o livro para que ele fique bem no fim. Essa é a magia da personagem principal.
Mas engane-se quem pensa que a personagem principal é tudo.
Muitas vezes não damos o devido valor às personagens secundárias. São elas que muitas vezes ajudam a dar o contexto à história, ajudam a engrandecer as qualidades do nosso herói – pensemos em Watson para Sherlock Holmes – ou a minimizar conflitos interiores da nossa personagem principal. Porque embora, muitas vezes, ela pareça saída de um mundo fantástico, quase a roçar a perfeição, vai encontrar sempre obstáculos que não conseguirá ultrapassar sozinha. E é essa a beleza do livro, da história. Mostrar-nos a vida como ela é, ajudando-nos a perceber coisas que escapam, muitas vezes, ao nosso olhar natural.
Assim, as personagens, são o tecido da nossa história, são talvez o ponto mais importante de um enredo. São elas que dão seguimento à ação, são elas que emitem opiniões dentro daquele mundo do livro que estamos a conhecer são, no fundo, elas que nos fazem companhia quando dizemos que um livro é a melhor companhia que podemos ter. Não será o livro, mas a história. E na história, as personagens.
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