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Edição 698

A Trofa na rota da Via Romana (VIA XVI Braga-Porto-Lisboa) – Parte 2

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Reconstituição possível do traçado da antiga Via Romana – da Carriça à Ponte da Lagoncinha

Vinda de Olisipo (Lisboa), com passagem por Cale(Porto), e chegada à Carriça (Muro = Milha XXIII), mais ou menos paralela ao atual traçado da atual EN 14), no cruzamento da Carriça, a antiga estrada (Via Romana XVI) virava à esquerda, atual Estrada Nacional 318 (Paços de Ferreira-Vila do Conde), ladeando duas casas antigas, pertencentes à atual família Couto Reis, cujo brasão “de família” nos aparece por cima da porta de entrada daquela que outrora terá sido uma Venda (e Hospedaria?), local de paragem “obrigatória” para descanso de animais e pessoas.

A propósito desta zona da Carriça, (cruzamento e casa “brasonada”), faz-se aqui um parêntesis para referir o que Alberto Pimentel escreveu numa das suas crónicas de uma Viagem (de Mala Posta) de Porto a Braga, em pleno século XIX:

“Partia-se do Porto às 11 horas da noite, saindo da rua de Entre-Paredes e rodava-se pela Batalha… até ganhar o largo de Aguardente, que era nesse tempo o limite do povoado da cidade. Depois entrava-se em pleno campo… fazendo-se a primeira paragem na Carriça, onde o Silva, um homem forte e ancho, sempre de jaqueta, chapéu redondo na cabeça, vendia aos passageiros uma água de castanhas, a ferver, convencionalmente denominada café”.

Continuando a viagem: Volvidos cerca de 80 metros, a via fletia para a direita (atual Rua de Santa Maria), já no território de Alvarelhos; andados pouco mais de uma centena de metros, voltava à direita, por um caminho semi-requalificado; daqui, por entre pequenos “carreiros” rurais chega-se à Quinta do Paiço; junto desta quinta, em Sobre-Sá, apareceu um epitáfio de Ladronus, referindo o Castro de Madequisensis, possivelmente designado por Madiae, topónimo que poderá estar na designação do atual concelho (Maia?) hoje no Museu da Maia (Silva ACF 1980); desta, a via seguiria pela Ribeira da Aldeia, ainda em Alvarelhos, depois em direção à Peça Má, Lantemil (Milha XXII), descia a serra de Bougado, contornava uma pequena elevação (monte), onde veio a ser construída a capela de Nossa Senhora da Livração, descia alguns metros, para próximo do ribeiro de Covelas (agora Rio Trofa), “atravessava” (passava sobre) a antiga ponte romana de Cedões, onde foram descobertos quatro marcos miliários. A partir daqui, segundo relatam alguns historiadores (um dos quais é o Prof. Dr. António Cruz), seguiam duas vias em direção ao atual centro da Trofa, sendo (a primeira via) – a que vem descrita pelo autor bougadense, – aquela que “virava à esquerda” passando ao lado da “velha ermida de Nossa Senhora da Graça, hoje da invocação de Santa Luzia”, em direção à Samogueira, local onde foi construída a Estalagem/ou Venda da Samogueira, de que restam ainda hoje alguns vestígios, sobretudo na entrada desta casa; seguia em frente, passando ao lado do atual Mercado/Feira da Trofa, até ao largo do Padrão, e seguia em direção ao Vau. A outra via iniciava junto à ponte de Cedões, rumava para o centro da Trofa, passando pelo “Monte da Carriça” (onde foi erigida a atual capela da Nossa Senhora das Dores), Valdeirigo, Estação Velha da Trofa/Igreja Matriz de S. Martinho de Bougado e Real.

Estalagem da Samogueira

No que diz respeito à primeira via, no (atual) Largo do Padrão, em Bougado, havia uma outra Hospedaria, agora Restaurante do Padrão, onde ainda hoje se encontra um vestígio, uma pequena “argola”, onde se prendiam os cavalos). A via seguia até à Barca, pelo lugar de Finzes. Num dos largos deste lugar, foi construído um monumento em homenagem aos Trofenses “tombados” em defesa da Barca nas célebres Invasões Francesas, naturais, quer da freguesia de Santiago de Bougado, quer da de S. Martinho de Bougado). “Continuando o seu curso, a par e passo, a via segue(iria) quase em linha recta, (entre casais e estabelecimentos fabris)” (Napoleão de Sousa Marques, em Cidade da Trofa, Duas Comunidades, Um só Povo), pelas atuais Ruas Ramalho Ortigão e Antero de Quental, sempre próximo da margem do rio Ave em direção à atual Rotunda dos Bombeiros, cortava a atual EN 14, passava paralela ao quartel dos B.V. da Trofa (Rua Alberto Pimentel), até ao Cruzeiro de São Martinho – o mais antigo e histórico cruzeiro desta freguesia, construído em 1622-, continua(va) passando em frente da Casa da Vinha, em direção a Real, lugar onde existia uma ponte romana “de aduelas” por onde passa o ribeiro de “Real” ou de “Paradela”, ponte essa que foi substituída pela atual (de betão) em 1960, sem antes ter havido o mínimo de sensatez de, ao menos, se ter deixado, em local bem visível, uma “aduela” como “relíquia recordativa” para a história. Para que conste, o nosso conterrâneo e arqueólogo Abade Joaquim Pedrosa deixou-nos o seguinte testemunho, sobre esta ponte primitiva, entretanto demolida: “Mas, no lugar de Real, sobre um córrego, perto da estação da Trofa há uma ponte romana, um ‘arquinho’ de aduelas…”

A via continua(va) quase que esbarrando frontalmente na Casa de Real,… “flecte em ângulo recto…”, volta a dobrar a 90º (fazendo curva e contra-curva), e lá vai em linha reta, passando junto da Casa da Eira (restaurada recentemente); até que, na atualidade, a 200 metros, é cortada pela linha de comboio, para depois seguir pela Rua Teixeira Lopes, Rua Júlio Brandão (na Esprela), descendo em direção ao Rio Ave, atualmente por um “carreiro”, (ladeando a vedação da linha da CP, tendo a “Ponte de Ferro” à esquerda), segue por caminho em terra batida – paralela à margem do rio Ave-, numa extensão de cerca de um quilómetro, já em território da Gandra e Abelheira, aqui e ali com alguns “vestígios antigos” (notando-se as marcas dos rodados das carroças ou de carros de bois).

Já na zona da Abelheira, encostado a um muro de uma quinta privada, existe um pequeno marco, que está a ser estudado por investigadores de história romana. Junto à “divisória que separa a freguesia de São Martinho de Bougado da de Lousado, mais precisamente no lugar da Cidreira, na margem esquerda do rio Ave, encontram-se bem marcados no xisto, de que é formado o terreno, os vestígios da antiga via romana…” (Napoleão de Sousa Marques em Cidade da Trofa – Duas comunidades… Um só Povo”).

A cerca de uma centena e meia de metros antes da ponte da Lagoncinha (em Lousado) existe a “ponte sobre o ribeiro de Ervosa” – também conhecida por “Ponte Velha”, – igualmente romana -, que, segundo alguns historiadores, sempre fez parte do território de Ervosa durante toda a Idade Média… até ao ano de 1834, em que a paróquia de São Bartolomeu de Ervosa foi extinta…

Ponte da Lagoncinha

Esta ponte poderá ter sido construída no tempo dos romanos. Na sua forma atual, a ponte é uma construção medieval, mas é bem provável a existência de uma anterior romana nesta passagem natural, embora não existam vestígios concludentes; num documento de 1054, há referência à ponte e à via romana “per illam carrarium antiquam quo uadit a ilum pontem petrinum (PMH DC 287).

Na carta do Couto do Mosteiro de Santo Tirso, do ano de 1097, aparece uma “ponte antiqua de flumine Ave (PMH DC 864)”, mostrando que no século XI já existia neste local uma ponte de pedra sobre o rio Ave, possivelmente um pouco a montante junto da Cruz do Lugar das Marcas (Barroca 2004), numa época em que a Via Romana (Via XVI) estabelecia a ligação entre Porto e Santarém, naquela que era considerada uma das mais importantes vias do Império Romano.

Segundo um original antigo, e alegadamente escrito no século XIII, “Vias Romanas em Portugal” – Itinerário XVI-Bracara-Calle-Aemnium, Olisipo, na travessia do rio Ave há uma ponte “romana” chamada “Medieval da Lagoncinha”.

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A atual ponte da Lagoncinha terá sido a passagem mais antiga sobre o rio Ave, nestas redondezas, e, segundo alguns historiadores, foi erigida a expensas de D. Goncinha.

Cerca do ano 1103, existia uma senhora, com bastantes posses, chamada Godinha Polizeris, ao tempo esposa de D. Egas Ermiges. Esta doou ao Mosteiro de Santo Tirso, através do Abade Gaudemiro, uma herdade em Bougado (S. Martinho?) e a oitava parte da Igreja de São Mamede de Ribeirão. D. Goncinha (Godinha) era “uma senhora illustre que morava junto ao Rio Ave, junto à ponte, que dela parece tomou o nome com alguma corrupção do vocábulo, porque ainda hoje se chama ponte da Lagoncinha” (frei Leão de Santo Tomás, ob.cit,pág 24). “D. Goncinha Dunes, filha de Nuno Soares Velho e Ausenda Tudereis, estava ligada à família patronal do Mosteiro de Santo Tirso, pelo lado materno” (referência de um autor biográfico). Conta-se que “no remanso paradisíaco do Ave junto à ponte da Lagoncinha e capela de São Lourenço, a moça (D. Goncinha), que a lenda não diz ser bonita se feia, mas romântica, por certo, esperou o seu pagem fazendo ‘rendez vous’ de tabuleiro de seixo e granito, que sobre o rio, ligava Santarém a Braga, e lá do fundo, no espelho das águas a sua imagem, de largos e fartos bandos, reflectia-se sonhadora e poética…” (Jornal de Famalicão-285-11.09.1954).

Esta ponte sofreu várias requalificações/reparações ao longo de vários séculos (XI, XII, XV, XX) e ultimamente, durante o ano de 2018.

Entre os séculos XVI e XVII, a ponte pertenceu, na sua metade sul (do lado de Ervosa), à Câmara do Porto, na metade norte (do lado de Lousado), à de Barcelos. Entre estas entidades houve sempre vários desentendimentos e prolongados litígios, sobre a posse, tanto da Ponte, como das respetivas áreas (divisões) administrativas (entre os bispos de Braga e Porto), sendo que alguns deles tiveram que ser “resolvidos” pelos papas Pascoal II e Calixto II, respetivamente, pois, “de jure” a ponte chegou a “pertencer” à paróquia de São Bartolomeu de Ervosa, que mais tarde veio a chamar-se Sam Bertolameu da Lagoncinha.

Nota: Os historiadores Prof. Carvalho Correia e Napoleão de Sousa Marques “dão eco” desses litígios nas suas obras de investigação sobre a história da paróquia de São Bartolomeu de Ervosa e a sua “relação” com a ponte da Lagoncinha. O professor Napoleão Sousa Marques adianta que esses “litígios duraram muito tempo reivindicando cada uma das dioceses (Braga e Porto) a posse administrativa dessa ponte, assim como do território adjacente onde a mesma se situava…”

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