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Edição 472

Opinião: Homens de Plástico

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Ricardo Garcia

Ouvir e ver o nosso primeiro-ministro não tem sido tarefa nada fácil, pois não consigo distinguir a realidade da ficção. Para quem conhece o filme Blade Runner (Ridley Scott, 1982), Pedro Passos Coelho parece um replicante ou humanoide, um robot orgânico construído por uma grande corporação, incapaz de se distinguir no meio dos humanos.

Personagem criada no cavaquismo, desapareceu de cena quando este acabou, voltando na alvorada desta década, num remake para satisfazer uma direita de jovens turcos apadrinhados por anciões com vastos conhecimentos no enredo dos partidos que nos têm governado nos últimos anos. Modus operandi? Manobras concertadas na blogosfera, em fóruns ou na Comunicação Social mais declarações de políticos veteranos, como esta de Mário Soares em 2010: “Conheço Pedro Passos Coelho e considero-o um homem muito sensato, lúcido e com um grande sentido de Estado. E o que os políticos precisam de ter nesta altura é um grande sentido de Estado, defendendo sempre o interesse nacional, porque nesta altura é Portugal e a Europa que estão em causa”. Os mercados querem, os bancos sonham, a obra nasce. Foi assim em 2011.

Tal como nos filmes, as personagens mais sinistras preferem ficar nos bastidores, tentando criar alguém que seja fácil de manipular e que se possa controlar remotamente. Quando oiço Passos Coelho a falar (confesso que oiço mais do que vejo), fico sempre com a sensação de que está a falar por alguém e nunca pela sua cabeça. A entrevista (?) à SIC e, principalmente, as declarações proferidas durante um almoço no dia 25 de Abril não são declarações frias tipo tecnocrata-economista-folhaExcel-VítorGaspar. A entrevista (?) foi ao estilo “Conversas em Família” e o discurso no repasto foi sobre bafio e horticultura. Passos Coelho fala sempre com o mesmo tom (previamente incorporado?), esteja a falar de macroeconomia ou de bolas de naftalina.

A apresentação do Documento de Estratégia Orçamental (DEO) foi a derradeira prova desta unidade replicante. Enquanto na versão beta (José Sócrates) o mundo muda em 3 semanas, nesta unidade 1.0 o mundo já muda em duas semanas. Em duas semanas se passou de um não agravamento da carga fiscal ou de sacrifícios adicionais para um aumento do IVA e da TSU “o mais pequeno possível” (palavras da replicante versão feminina). A própria linguagem também foi aprimorada. Depois do “aumento brutal de impostos” (palavras do replicante com processador mais lento na parte vocal), a passagem para um aumento “o mais pequeno possível” é um claro melhoramento nos processadores de texto. Se a isto juntarmos as alterações semânticas introduzidas pelo replicante irrevogável, a língua portuguesa está em constante mutação.

Estas constantes atualizações ou novas versões trazem-me um problema. QuandoPassos Coelho vem dizer que o aumento do IVA e da TSU tem como objetivo aliviar os pensionistas, repartir os sacrifícios e que a medida irá beneficiar a “médio prazo” a economia, já não consigo soltar impropérios contra a televisão. Ou melhor, quando tento preparar algum impropério, penso que não há diferença no objeto televisão ou no objeto replicante.

Ricardo Garcia

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