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Crónicas e opinião

Festas de Nossa Senhora das Dores da cidade da Trofa

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Romaria de Nossa Senhora das Dores da Maia, Festas da Trofa e Festas de Nª Srª das Dores (da Cidade) da Trofa, têm sido os títulos de “cartaz” porque tanto outrora, como hoje, as festas em honra de Nª Srª das Dores da Trofa são conhecidas, de norte a sul do País. Acontece que parece haver da parte de algumas pessoas uma certa dificuldade ou um certo receio em compreender (e assumir) todos estes títulos, porque eles poderão não ser “reais” ou “legais”, mas são-no de facto, porque o tempo e o povo já os “baptizou” e “assumiu”. E todos nós trofenses, não podemos ter vergonha nenhuma em referi-las onde e sempre que isso acontecer.
A história e o passado das nossas festas foram e são o orgulho de muitos trofenses (principalmente os fregueses e/ou paroquianos de S. Martinho de Bougado) que durante quase cerca de 260 (duzentos e sessenta anos) têm levado a bom porto a organização de tais festividades em honra da Mãe das Dores.
Desde aquele longínquo mês de junho de 1766 em que o reverendo Abade Inácio Pimentel, juntamente com alguns “fregueses” (a representar a paróquia de então) fez a petição ao bispo diocesano, referindo haver na sua paróquia uma grande devoção à Virgem das Dores, solicitando autorização de erigir uma capela dedicada a Nossa Senhora das Dores no local chamado Monte da Carriça, o povo uniu-se para construir o minúsculo templo, que, passado um século, seria necessário erguer, de raiz, uma nova capela, bem maior devido à quantidade de romeiros que afluíam à “ermidinha”, principalmente nos dias de festa.

Devoção a Nossa Senhora das Dores

A devoção a Nossa Senhora das Dores já vem de há vários séculos; os primeiros registos desta ancestral devoção vêm da Alemanha, no ano 1221. Posteriormente, por volta de 1239 a veneração a este título de Maria, chegou a Itália e a partir daí, a toda a Europa, América e África. O dia litúrgico da festa de Nª Srª das Dores é 15 de setembro.
Em Portugal, a festa de Nª Srª das Dores é celebrada em muitas localidades (mais de 50), recebendo a Santa diversos nomes em cada localidade: Nª Srª das Dores, Nª Srª. das Angústias, Nª Srª da Agonia. Nª Srª da Piedade, Nª Srª do Pranto, Nª Srª do Calvário, Nª Srª das Lágrimas, etc.
Mas a devoção a Nª Srª das Dores não se deve, nem se mede, pela quantidade de festas que se realiza em sua honra, já que é notório que quase todas as paróquias do norte do País, e não só, têm, nas suas igrejas e/ou capelas um altar ou uma imagem dedicada a Nª Srª das Dores. Mas na Trofa, e particularmente na paróquia de S. Martinho de Bougado, a devoção está já muito “arreigada,” desde há pelo menos dois séculos e meio: prova-o a quantidade de imagens e quadros da Virgem das Dores espalhados pela freguesia: assim, muitos paroquianos têm, ora no interior de suas casas, ora no exterior (nas sacadas), várias imagens, pinturas e painéis de azulejos, representando as várias facetas e expressões das dores de Maria. Algumas imagens são autênticos quadros “bíblicos” de contemplação e emoção… Há, também, a acrescentar, que várias instituições têm como patrona a Nossa Senhora das Dores:
-Colégio (inicialmente chamava-se Externato Nª Srª das Dores) da Trofa.
-Lar Padre Joaquim Ribeiro
-Santa Casa da Misericórdia da Trofa, desde a sua fundação (08.09.1993)

Imagem de Nossa Senhora das Dores

Nossa Senhora das Dores é representada com um semblante de dor e sofrimento, tendo 7 espadas “cravadas”, ferindo o seu coração de Mãe (de Jesus)… às vezes uma só espada trespassa esse mesmo coração, simbolizando todas as dores que ela sofreu. Ela é igualmente representada com uma expressão sofrida diante da Cruz , contemplando o seu Filho morto no Calvário. (Uma destas expressões é vista na imagem de Nª Srª das Dores da Póvoa de Varzim). Foi daí que que teve origem o hino medieval chamado “Stabat Mater Dolorosa” (Estava, de pé, a Mãe Dolorosa). Ela é representada, finalmente, segurando Jesus morto nos seus braços, depois de seu corpo ser descido da Cruz, dando assim origem à famosa escultura chamada “Pietá”.

“Retratos” escritos das festas de Nossa Senhora das Dores entre 1873 e 1890

“Regorgitavam de passageiros os combóios do Minho, e os char-à-blanc, os breacks, as diligências, todos os meios de transporte vão empilhados de gente, puxadas por dois ou três magros bucéfalos… parando invariavelmente nas subidas até que as aliviem de 2/3 da carga e esperando fleumaticamente nas descidas…
Enchem a estrada os ranchos numerosos, que fazem o caminho cantando e dançando… em que as raparigas de pequenos chapelinhos emplumados e saias de vistosas romagens, ouradas e descalças, vão à desgarrada, ou em coros, de uma grande suavidade melódica ordinariamente acompanhados a “harmonium”.”

E continua o cronista referindo que… ali à frente está o espaçoso largo da romaria “povoada de barracas” de comes e bebes, “carros cheios de melâncias e pipos de vinho. Ao centro… “levanta-se a moderna capela (é já a actual) das Dores, onde se não pode entrar no dia da festa, tais são os apertos e a acumulação do povo, junto das portas principal e travessas” (José Augusto Vieira, in Minho Pitoresco).

Segue-se outra descrição de outro autor (da mesma altura):
“Em sítio sobremaneiro aprazível (referindo-se ao actual parque de Nª Srª das Dores) e cercado de grandes moutas, ao Km 26 desta linha de ferro (Linha do Minho), e perto da estação da Trofa, está construída a formosa ermidinha, dedicada a Nª Srª das Dores à qual se faz todos os anos uma grande festividade, e concorridíssimo arraial, no dia 15 de agosto. Há então combóios a preços reduzidos em todas as estações da linha da estação do Pinheiro (Porto) chegam aqui muitos combóios cheios de romeiros e o mesmo de outras localidades distantes, além de trens particulares, cavalgaduras e ranchos que vêm de diferentes partes.
Muitos levam cestos, malas e trouxas com os competentes merendeiros; outros levam violas, rabecas, clarinetes, bombos, etc., que tangem em todo o caminho e no arraial, dançando homens, mulheres, ao som dos instrumentos…”.

“Depois da festa da igreja (Missa), há procissão de tarde com 6 andores, quase todos de uma altura considerável, que é o luxo destas terras. Cada um é levado por 20 homens…” (Os andores, serão os precursores dos actuais ou mesmo os originais, “protótipos”?).

“Finalmente, no Minho, onde há tantas e tão brilhantes romarias, é esta uma das mais concorridas. Há uns poucos de anos, que o opulento proprietário, o senhor comendador Manuel José Ribeiro (o futuro Conde S. Bento) é o juiz da festa, com a qual despende, em cada ano, mais de 500$00 reis”. (Pinto Leal, in “Portugal Antigo e Moderno”).

As décadas de ouro das grandiosas festas

Com o advento da era industrial e o consequente desenvolvimento da freguesia de São Martinho de Bougado, as festas ganharam, a partir, principalmente das décadas de 50 do século passado, até aos inícios do actual milénio, uma grandiosidade ímpar, a todos os títulos, tanto na vertente religiosa, como na parte profana.
Desta forma, além da celebração da Missa do dia principal da Festa(3.º domingo do mês de agosto), passou a incluir-se uma Procissão de Velas que dá início ao chamado septenário, que significa 7 dias de celebração das “7 Dores” por que é venerada a Virgem das Dores, (na parte religiosa). Essa procissão realiza-se no sábado da semana anterior à da festa.
Os cartazes-programa das festividades anunciavam, um mês antes das festas, um leque de eventos culturais e recreativos que iriam ocorrer durante cerca de uma semana e não apenas os 4 dias tradicionais: sábado, domingo, segunda-feira e terça-feira:
Festivais de Folclore, Concertos de Tunas estudantis, Festival de Canção ligeira, Concurso de Fados, Desfiles Alegóricos de todas as actividades (agrícolas, comerciais e industriais), além dos concertos das mais conceituadas Bandas de Música, e, nos últimos anos uma noite de concerto de um artista de renome, atraiam e atraem, ainda hoje, à cidade da Trofa, nestes dias de festa, milhares de pessoas de diversos cantos do País. As diversas sessões de Fogo de Artifício, (neste período duas no sábado e outras duas no domingo) e a Majestosa Procissão com os grandiosos andores, únicos no País, foram, sempre, e serão, no futuro, sem dúvida, os principais “chamarizes” da Romaria.
Fazia parte da tradição, durante o período das festas “estrear-se “um fato, camisa, sapatos; ou vestido, conjunto “casaco-saia” (no caso das raparigas). Os pais/ou as próprias compravam alguma jóia para elas( raparigas solteiras) se “mostrarem”-numa espécie de passagem de modelos,- pelo “terreiro” da festa, para assim poderem atraír a si os candidatos a namorados. Os comerciantes preparavam as suas “montras” para que os visitantes, durante as noitadas, pudessem admirar e, se possível, comprar algum artigo no dia seguinte. Era aquilo a que se chamava o “concurso de Montras”, não oficial, mas sempre “competitivo”, porque havia sempre o factor “surpresa”. Quem avaliava a qualidade das montras era o público visitante.
Em 1966, ano da comemoração do bicentenário da construção da capela, a freguesia mobilizou-se para celebrar, com especial regozijo e grande solenidade, os duzentos anos da festa à sua Mãe das Dores. Todas as ruas principais da freguesia foram ornamentadas a rigor, para receber as altas individualidades civis, militares e religiosas de então, assim como muitos milhares de romeiros que quiseram agradecer à Senhora das Dores as “graças obtidas”e ofertar as suas promessas.
O ano de 2000 vai ficar parta a história como o ano em que a Trofa se tornou na capital dos Zés Pereiras do País: a Comissão de Festas desse ano (da aldeia do Paranho), conseguiu trazer às Festas da Trofa 2001 Zés Pereiras, (com Gigantones e Cabeçudos), sendo considerado na altura a maior concentração de Zés Pereiras de sempre, em Portugal.
A procissão com 10 imponentes andores que integram o cortejo religioso, (que se realizará a meio da tarde), é o ponto alto das festas.
Às primeiras horas da manhã de domingo, os “armadores” e seus colaboradores procedem ao levantamento dos respectivos andores no adro da Igreja Matriz, e começam a ultimar a ornamentação dos andores: Traços de franjas e cordões (também chamados “rosários”), estrelas cintilantes e outros acessórios, são colocados nos andores, e por último posicionam os santos no seu “trono”. Uma multidão de romeiros e visitantes aglomeram-se, junto à Igreja Matriz de S. Martinho de Bougado para verem e admirarem “ in loco” autênticas obras de arte ornamentadas.
Ao toque das 17 horas, repicam os sinos e uma salva de morteiros anuncia o início daquela que é a “ex-libris” das festas da Trofa- a Majestosa procissão. Uma guarda de honra a cavalo abre o préstito religioso, seguindo-se o rufar da fanfarra dos escuteiros da paróquia de S. Martinho de Bougado, assim como todas as confrarias; seguem-se os 10 andores representativos de todas as aldeias da freguesia, bem como cerca de duas centenas de anjinhos e figurantes bíblicos. A encerrar o cortejo religioso vai o Pálio, logo atrás seguem os responsáveis máximos da Comissão de Festas, autoridades, bandas de música, ex-votos cumprindo suas promessas e muitos devotos de Nossa Senhora das Dores.
O percurso da procissão é feito desde a Igreja Matriz, passando pelas ruas principais da cidade, entra no Parque, passa em frente à capela de Nossa Senhora das Dores e regressa à Igreja Matriz, percorrendo uma extensão de cerca de um quilómetro. À passagem pelas artérias da cidade, milhares de romeiros, ou simples visitantes acotovelam-se para apreciarem de, perto, o desenrolar da procissão, principalmente a grandiosidade e os vários “pormenores” da ornamentação e/ou colorido dos andores.

Armador tirsense Luiz da Silva Godinho é o “pai” dos andores da Trofa

Como nasceram os Andores das festas de Nossa Senhora das Dores da Trofa? Não se conhece a data exacta do “nascimento” dos “maiores” e mais antigos andores da Trofa (quiçá do País), ornamentados com cetim, “rosários” (ou “terços”), estrelas ou espelhos cintilantes. O “armador” Luiz da Silva Godinho, de Santo Tirso, terá nascido no ano de 1887/88. Desde a sua juventude que lidava com tecidos de cetim na ornamentação de igrejas, (nas festas e/ou funerais de pessoas ilustres) e, segundo informações fornecidas por familiares, ainda vivos, e corroboradas por João Silva (sócio-gerente da Funerária Trofense), um dia Luíz Godinho foi abordado pela Comissão de Festas da Senhora das Dores, sendo desafiado a ornamentar os andores da Trofa. Ele aceitou o desafio, referindo que aceitava o repto na condição de ornamentar todos os andores. Negócio fechado. Terá sido na década de 1920, – quando ele já estaria próximo dos 30 anos -, que iniciou este trabalho (ornamentação) “artístico” e “manual” feito essencialmente, com tecidos (cetim) cobrindo a carcaça de madeira, muitos quilos de alfinetes, e… muita paciência. Nos anos sessenta, já ele ornamentava todos os andores das festas do concelho de Santo Tirso, e era visto a ornamentar andores de outras festas em outros concelhos vizinhos.
Alguns anos antes do seu falecimento, em 1976, foi deixando de fazer os andores, até que entraram outros armadores na “disputa” da ornamentação dos andores. O Armador Gonçalo Silva (pai de João Silva) fez o andor de Paradela no ano de 1969. Outros armadores foram tomando conta da confecção dos andores: o Vilela, o “Massas”, o Artur Carvalho (de Travanca) e o Senra (de Aparecida-Lousada). O nosso conterrâneo João Silva “entrou” oficialmente na ornamentação dos andores da Trofa no ano de 1973. Chegou a fazer 7 andores, inclusive o do Paranho (Nossa Senhora das Dores). Deixou essa área no ano de 2018, por falta de pessoal. A.C.

ANTÓNIO COSTA

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