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Edição 707

Os números da destruição do nosso sentido de humanidade

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Os números têm o grande perigo do hábito. Habituamo-nos, em muito pouco tempo, a que o número de pessoas forçadas no mundo a abandonar as suas casas devido a guerras, conflitos, violência, perseguições, violação dos direitos humanos ou desastres naturais aumente todos os anos. Em 2018, ultrapassou os 70 milhões. Só no ano passado, 37 mil pessoas por dia ou 25 pessoas por minuto tiveram que deixar as suas casas sem qualquer certeza de regresso.

Os números também têm o grande perigo do medo. Não temos muito medo que nos toque a nós: facilmente nos distanciamos com a ideia de que isto só acontece “naqueles” países. Temos medo de sermos muito poucos no meio de tantos e que isso possa significar uma espécie de invasão. Certo é que os dados são muito claros a contrariar este sentimento de medo da migração como mancha: 97% da população mundial não migra. É interessante verificar que somos mais resistentes ao acolhimento de migrantes, quanto menos população estrangeira temos. Superando estes perigos dos números, podemos começar a trocá-los por pessoas concretas. Muitas delas próximas, até.

Entre os demasiados exemplos, olhemos para o campo de refugiados de Moria, na ilha grega de Lesbos. Estão quase 19 mil pessoas há demasiado tempo num lugar com condições para alojar temporariamente 3 mil. Alguns dos processos têm a primeira entrevista marcada para 2023, o que significa que não podem abandonar o campo até lá. A Médicos Sem Fronteiras (MSF), com trabalho nos contextos mais difíceis dos nossos tempos, considera o pior campo de refugiados do mundo. E está aqui ao lado, na nossa Europa.

Trocar por pessoas concretas significa apontar com muita clareza a culpa das 5 pessoas que morreram nos últimos 2 meses, incluindo duas crianças e um bebé. Significa assumir a responsabilidade das crianças com 2 anos que se mutilam e das que dizem às unidades de apoio psicológico que preferiam morrer a viver ali. Significa assumir a responsabilidade das crianças que já tentaram o suicídio, das crianças que se isolam, que não querem brincar ou falar e das que arrancam cabelos ou batem com a cabeça nos contentores.

Chegamos até este ponto ultrapassando vários momentos em que escolhemos ignorar o que se estava a passar. Não foi falta de informação. Foi uma escolha. Quando duvidamos que alguém em alto mar deve ser salvo de afogar-se, estamos a escolher o tipo de humanidade que somos: a humanidade que banalizou e relativizou a miséria, o sofrimento e as mortes. Somos uma humanidade numa espiral de medo que nos conduz ao ódio profundo de tudo o que está mais ou menos próximo.

Tendemos a relativizar realidades que questionam a nossa humanidade. Como estas realidades são de urgente resposta e de implicação directa com o nosso sentido de justiça, compaixão ou solidariedade, tendemos a relativizar para nos distanciarmos e nos protegermos. Para podermos falar sobre os tempos que vivemos, vamos começar por colocar nomes às coisas. É muito importante tratarmos os fenómenos pelos nomes. A partir do momento em que lhe damos um nome, podemos identificá-los, tomar posições e preveni-los. Facilmente, caímos na trapaça de acharmos que é xenofobia, o medo de estrangeiros. Não é. Nós não temos medo de estrangeiros. É globalmente aceite a narrativa do turismo enquanto algo benéfico. Aliás, em Portugal até nos gabamos pela nossa arte de acolher os estrangeiros. Temos medo das pessoas em movimento, ou vulgarmente chamados de refugiados, não porque são estrangeiros, mas porque os vemos enquanto miseráveis e pobres. O nosso problema chama-se aporofobia: “aporos” (pobre) com “fobia” (medo) em grego. Aporofobia, o medo dos pobres.

Quando falamos de uma “crise de refugiados” temos de falar muito mais de uma “crise da nossa humanidade”. É aqui que tudo se torna muito mais perigoso. Não é difícil habituarmo-nos a que esta nossa humanidade seja preenchida por medo. O medo só tem um caminho: o ódio pelo outro, o ódio pelo próximo e o ódio pelos nossos. Ainda vamos a tempo de minimizar o impacto destrutivo desta questão no que somos enquanto sociedade. É urgente olharmos para cada uma das pessoas em condições miseráveis e restabelecermos a dignidade humana como valor sagrado.

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Carnaval no Coronado a 25 de fevereiro

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O desfile de Carnaval do Coronado já tem data marcada. A 25 de fevereiro, às 14 horas, o corso parte do Largo da Igreja de S. Mamede em direção ao Largo da Igreja de S. Romão.

Neste desfile participam, além dos foliões, as crianças que frequentam as escolas da freguesia do Coronado, apoiadas pelas respetivas associações de pais.

No final, realizam-se os leilões das comissões de festas de S. Bartolomeu e do Divino Espírito Santo.

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Compete-nos a nós, jovens, mudar esta sociedade

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Tenho 14 anos e ando no 9.º ano de escolaridade. Frequento a escola de S. Romão do Coronado. Tenho uma vida normal como todos os adolescentes. Escola, família, amigos e hobbies. Gosto de ficar em casa ver uma série ou jogar. Muitas vezes, ouço a minha mãe falar que, na geração dela, as brincadeiras eram na rua, os amigos eram os vizinhos, não existiam redes sociais, nem telemóvel. Como é possível?

Por vezes, questiono-me se a minha geração é que está errada ou seria a dos meus pais…

Sinto que também o universo digital é o aspecto mais característico da minha geração. Eu, apesar de não ser dependente do telemóvel, pergunto-me como foi possível os meus pais terem o seu 1.º telemóvel quando começaram a trabalhar. Eu tive o meu no 5.º ano.

Sinto que somos muito mais independentes com toda esta realidade. Quero ter acesso a informação, vou à internet… quero vender alguma coisa vou à internet… A minha mãe refere que comprou o 1.º gravador quando trabalhou em tempo de férias. Eu, com esta idade, tenho uma playstation.

Apesar de estar a viver numa geração em que sinto que tenho tudo mais facilitado, tenho as minhas preocupações de adolescente. As minhas aspirações escolares e até profissionais. Verifico que existe mais competitividade entre os alunos e acredito que esta competição vai ser cada vez maior, devido ao avanço das tecnologias.

Um aspecto que me preocupa são as mudanças climáticas. Daqui algum tempo como estará o nosso planeta? O aquecimento global e a crise climática de causas humanas preocupam-me. Devemos assumir todos este problema e tomarmos medidas de prevenção e mudarmos alguns comportamentos para estabelecermos uma nova relação com o meio ambiente. Se não mudarmos, acredito que o nosso futuro não vai ser muito agradável.

Julgo que não é necessário fazer muito esforço. Economizar a água, reciclar lixo, separar papel, plástico, do vidro , e do metal… As nossas florestas estão cada vez mais devastadas pela ganância do homem, a biodiversidade está a desaparecer. O primeiro passo para a mudança seria investir mais nos jovens, porque somos o futuro de todos os países do mundo. Deviam dar-nos novas oportunidades, uma boa formação específica, abrir horizontes. Participarmos em workshops e manifestações, fazerem grupos com os jovens no sentido de expressarmos os nossos pontos de vista e preocupações. Compete-nos a nós, jovens, mudar esta sociedade.

Achei interessante alguns trechos de uma carta que foi escrita em 1855, pelo cacique Seattle, da tribo Suquamish, do estado de Washington, quando o então presidente Francis Pierce, dos Estados Unidos, deu a entender que pretendia comprar o território ocupado pelos índios: “Para [o homem branco], um pedaço de terra não se distingue de outro qualquer, pois é um estranho que vem de noite e rouba da terra tudo de que precisa. A terra não é sua irmã, mas sua inimiga; depois que a submete a si, que a conquista, ele vai embora, à procura de outro lugar.

Deixa atrás de si a sepultura de seus pais e não se importa. Sequestra os filhos da terra e não se importa. […] Seu apetite vai exaurir a terra, deixando atrás de si só desertos […] O que fere a terra fere também os filhos da terra. O homem não tece a teia da vida; é antes um de seus fios. O que quer que faça a essa teia, faz a si próprio”.

Sei que tenho que terminar o 9.ºano e que a partir daí vai ser a “doer” . Sinto um “friozinho na barriga” quando penso neste futuro desconhecido. Contudo, sei que vai ser a partir daí que me vou preparar, tanto ao nível académico, como psicologicamente para o meu futuro profissional.

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Em relação ao futuro profissional, tenho que trabalhar naquilo que gosto, mas também tenho ambição de ganhar dinheiro.

Sinto que esta fase também é a preocupação dos meus amigos da escola. A entrada para o ensino médio cria-nos insegurança e preocupação, não só pelas escolhas que iremos fazer, mas também pelos novos amigos e nova escola com que nos vamos deparar.

Mas com todas estas adversidades, tudo vai correr bem, porque como se costuma dizer “os jovens de hoje são os adultos de amanhã”.

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Edição impressa do jornal O Noticias da Trofa de 23 de março de 2023

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