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O poder de um elogio

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O despertar é ordinário. Acordo sempre na mesma cama, acompanhado pela mesma mulher e com o mesmo gato, deitado aos meus pés…que são sempre os mesmos. O esquerdo, nunca deixou de chutar torto, e o direito, nunca se deixou confundir com o esquerdo. O toque do despertador também é o mesmo, como o ódio que sinto ao desligá-lo. Arrasto-me sempre da mesma forma para a casa de banho e desejo ver-me belo, quando me vejo sempre igual, de olhos inchados, sobrancelhas e cabelo despenteados, mas nesta manhã, fiz algo diferente…liguei à minha mãe:

– Mamã, quem é o mais bonito?
-És tu e o teu irmão, filhinho! Sois os mais bonitos do mundo…
Estando razoavelmente satisfeito com a resposta, apesar de estar à espera que a minha mãe dissesse que, EU, é que sou o mais belo do planeta, em contraste com o que eu via no espelho, ela prossegue:
– …tal como para a mãe mocho os seus filhos mochinhos são os mais belos entre a passarada!

Desliguei o telemóvel, sem saber se me despedi, e a motivação que precisava para sair de casa com algum brilho, fui buscar ao baú das memórias, quando em 1984, duas irmãs gémeas, caixas de óculos, me disseram, “Tu até és girinho, pena seres gordo!”. Visto a minha roupa de domingo, apesar de ser sábado, e saí.

Depois de atravessar a estrada entre a “Pantir” e a rulote de farturas, enquanto inspiro um pouco de óleo frito, vindo da estrada, ouço:

– CALHEIROS, ÉS LINDO!

Repentinamente, olho para trás, e a carrinha de onde vinha o elogio distanciava-se sem eu ver a autora de tamanha clarividência.

Compro uma fartura, para repor os índices glicémicos, depois de tamanho “chapadão” de realidade, e sigo caminho.

Ao longo do passeio empinava o nariz e sentia-me apreciado (sem reparar se o era)…mas durante todo o percurso pensava quem seria a autora do elogio. De imediato, aquela voz rouca e aveludada, transportou-me para as “Divas italianas”, Claudia Cardinale, Gina Lollobrigida ou Sophia Loren, mas de repente fez-se luz, estas não podiam ser, já morreram ou são velhotas. Com a mesma certeza de que o Sporting vai ser campeão este ano, concluí, em frente ao “Talho da Linha”, que era a Monica Belluci. Tolo, desato numa correria desenfreada, intervalada com dois pulos laterais a cada sete metros de corrida, e entro na pastelaria “Lírio Amarelo”, onde tomo café em posição de pé-coxinho e achava que quem olhava para mim era indigno de me apreciar, apenas as grandes belezas comparáveis a Divas.

Ainda sob o efeito do elogio da Mónica (Belluci), retomo o caminho para casa a simular o galope dos cavalos, atravesso o parque “Senhora da Dores”, a passo de marcha, e atravesso a passadeira em saltos de Canguru.

(Esta excentricidade, provocou um choque entre dois carros)

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Ao passar em frente a uma barbearia, que antecede a entrada de minha casa, ouço lá de dentro a mesma voz que ouvi ao início do passeio:

-Como é Calheiros! Tudo bem?

Lá de dentro, em vez de sair a minha querida Mónica (Belluci), sai o meu querido amigo Miguel Paredes.

– És tu! – exclamo, desapontado.

– Claro que sou eu. Querias que fosse quem? Uma boazona?
(Claro que sim, pensei eu)

Desanimado, entro em casa, onde me esperava a mesma mulher e o mesmo gato, que têm o mesmo amor por mim…algum!

P.S. – Quando me deitei, lembrei-me que em 1984, duas irmãs gémeas, caixas de óculos, me disseram, “Tu até és girinho, pena seres gordo!”.

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