Crónicas e opinião
Qual foi a parte de “dialogar” e “negociar” que vocês ainda não perceberam?
“Ser eleito presidente de câmara não confere a Sérgio Araújo poderes ditatoriais, o que significa – no caso de se verificar que a coligação que lidera não quis negociar com os outros vereadores – que este desfecho é da sua exclusiva responsabilidade.”
1
Julgava eu que só os guerrilheiros do teclado não tinham ainda percebido que o equilíbrio de poder, na Trofa, mudou. Mas estava redondamente enganado, pelo menos a julgar pelo desfecho da primeira reunião do novo executivo camarário.
Sem surpresas, a votação da delegação de competências em Sérgio Araújo foi chumbada. E digo sem surpresas porque, tendo em conta os comunicados emitidos pela coligação Trofa em Primeiro, liderada pelo PS, e pelo movimento A Trofa é de Todos (TDT), liderada pelo anterior presidente António Azevedo, a coligação Unidos pela Trofa (UPT), que junta PSD e CDS-PP, quis impor a sua vontade de forma inflexível, sem se dar ao trabalho de conversar e negociar com os restantes vereadores.
Problema: a coligação Unidos pela Trofa não tem maioria, pelo que não pode impor a sua vontade aos restantes. Ser eleito presidente de câmara não confere a Sérgio Araújo poderes ditatoriais, o que significa – no caso de se verificar que a coligação que lidera não quis negociar com os outros vereadores – que este desfecho é da sua exclusiva responsabilidade.
Quer isto dizer que este chumbo poderia ter sido evitado. Mas Sérgio Araújo escolheu não o fazer. Talvez por ingenuidade, talvez por calculismo, sabendo que o chumbo lhe permitiria tentar transformar-se em vítima do PS e do TDT. Estou mais inclinado para a segunda opção, a julgar pelo silêncio a que se remeteu, não tendo emitido qualquer nota ou comunicado a justificar a sua posição. Lá diz o povo, na sua infinita sabedoria, que “quem cala consente”.
2
Apesar do silêncio da coligação Unidos pela Trofa sobre este caso, que é, até prova em contrário, da sua exclusiva responsabilidade, militantes de ambos os partidos desdobraram-se em esforços virtuais para tentar iludir os trofenses sobre o que se passou. Nas redes sociais falou-se em conluio entre PS e TDT, falou-se em “tentativa de prejudicar os trofenses” e noutras parvoíces que já conhecemos de anedotas passadas.
Isto leva-me a crer que, das três, uma: ou os militantes destes partidos julgam ter uma espécie de direito divino ao poder absoluto, ou não percebem o funcionamento das instituições locais, ou estão a ser instrumentalizados pela cúpula da UPT, algo a que já assistimos, várias vezes, no passado.
Desconheço a justificação para este absurdo, mas há algo que pode ser já factualmente constatado: após a reunião, a coligação Unidos pela Trofa usou o Facebook da Câmara Municipal da Trofa para dar força à sua narrativa. E isto é inaceitável por várias razões, entre as quais destaco duas: porque as redes sociais da autarquia servem a Trofa e os trofenses, não Sérgio Araújo e a coligação Unidos pela Trofa, e porque a publicação em causa transmitiu uma informação falsa, ao afirmar que “o Presidente não poderá exercer plenamente as funções executivas previstas na lei”. Sérgio Araújo está mandatado para exercer as suas funções. Mas isso não lhe dá o direito de exercer as funções que pertencem ao executivo camarário, do qual fazem parte todos os vereadores eleitos. Usar a página da CM da Trofa para mentir aos trofenses é absolutamente vergonhoso e revelador sobre a postura da UPT neste caso em concreto.
E mais: se, como afirma esta publicação da CM da Trofa, o chumbo da delegação de competências “vai atrasar projetos, obras e processos essenciais, afetando o funcionamento dos serviços municipais e, consequentemente, a vida dos Trofenses”, responsabilize-se quem não quis dialogar com a oposição. Porque se realmente formos prejudicados por este desfecho, o responsável tem um nome: Sérgio Araújo. A menos, claro, que Sérgio Araújo e a UPT nos provem, desmentido os comunicados do PS e do TDT, que tentaram dialogar e negociar com os restantes vereadores. Cá estarei, nesse dia, para me retratar. Mas a julgar pelos muitos dias que já passaram – escrevo estas linhas na Segunda-feira, dia 3 de Novembro – parece-me pouco provável que tal venha a acontecer.
3
Enquanto cidadão trofense, não espero apenas que Sérgio Araújo e a coligação UPT dialoguem e negociem com os seus pares. Espero, igualmente, que Amadeu Dias e António Azevedo, bem como os projectos que lideram, estejam disponíveis para esse diálogo e para negociar de forma séria e construtiva, com o superior interesse da Trofa e dos trofenses no topo das suas preocupações.
A responsabilidade que os próximos 4 anos exigem passa por todas as partes com assento no executivo camarário. Nem Sérgio Araújo pode impor um poder absoluto que não tem, nem Amadeu Dias e António Azevedo podem boicotar o trabalho da autarquia por tacticismo. Os trofenses estarão atentos e castigarão quem não estiver à altura do momento.
De igual modo, Sérgio Araújo e a sua equipa não podem usar os canais de comunicação da autarquia para fins de propaganda da coligação Unidos pela Trofa. A história destes abusos é longa, desde a criação do Correio da Trofa e dos milhares de euros que sairam dos cofres públicos para o financiar, até a outros projectos, igualmente falhados, nas redes sociais, tão articulados com o poder que chegou a dar-se o caso de uma dessas páginas fazer publicações iguais às do Facebook da CM da Trofa, antes mesmo de ser publicado na página da autarquia. Vantagens de se estar próximo do poder e da “outra senhora” que mandava naquilo tudo.
4
Por agora há turbulência no executivo camarário, mas, em breve, a mesma turbulência poderá chegar às freguesias de Bougado e do Coronado. Se o executivo PSD/CDS-PP, que governa estas juntas, optar pela mesma postura impositiva, tentando impingir orçamentos não-negociados com a oposição, estes poderão ser chumbados com total legitimidade. Porque é a assembleia de freguesia, não o presidente, que tem o poder de os aprovar.
Assim sendo, seria importante que Jorge Campos e Ricardo Santos optassem por chamar a oposição para que o orçamento vá ao encontro da maioria dos eleitos de cada uma das assembleias de freguesia. Caso contrário, não venham chorar lágrimas de crocodilo para o colo dos bougadenses e dos coronadenses. Quem não tem maioria tem que negociar. Se não o fizer, só se pode queixar de si mesmo. E se daí resultar dano para as freguesias e para os seus habitantes, serão eles os responsáveis.
É tempo de a coligação Unidos pela Trofa meter isto na cabeça de uma vez por todas: sem maioria, é preciso dialogar, negociar, ceder e chegar a um acordo maioritário. Caso contrário, serão eles os principais culpados por “atrasar projetos, obras e processos essenciais, afetando o funcionamento dos serviços municipais e, consequentemente, a vida dos Trofenses”. Por muita propaganda que circule nas redes sociais, factos são factos e estes são irrefutáveis.
Comportem-se como adultos.
Todos.


