Crónicas e opinião
Problema de Segurança

“O fascismo é uma minhoca
Que se infiltra na maçã
Ou vem com botas cardadas
Ou com pezinhos de lã.”
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Longe vão os tempos em que os fascistas se deslocavam pelo nosso país com pezinhos de lã. Agora é vê-los ameaçar e agredir sem filtro ou vergonha, de botas cardadas calçadas, em todo o esplendor da sua delinquência criminosa, a espancar cidadãos comuns na sopa dos pobres ou à porta de teatros.
A normalização das práticas terroristas a que temos assistido, por estes dias – que, estranhamente, não levou ao rasgar das vestes dos hipócritas securitários, que podem ter lá um ou outro amigo, ou colega de partido – tem várias origens. Não surge no vácuo nem é um fenómeno assim tão recente.
Trata-se de um terrorismo com raízes no ódio propagado pelo partido fascista, na legitimação do discurso troglodita no Parlamento por parte do Presidente da Assembleia da República, na importação do pensamento neofeudalista, a mais assustadora ideologia política desde o nazismo e o estalinismo, e, claro, nos burlões do YouTube, que descobriram que o ódio, a violência e a redução das mulheres a objectos são negócios tão ou mais lucrativos que a promoção de casas de apostas ilegais. Protejam os vossos filhos dessa gente.
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Apesar de parecer, as redes não são o problema. Mas são o veículo perfeito para os novos fascistas, perante a apatia dos democratas, com medo da própria sombra e de fazer o que há muito devia ter sido feito: regular o funcionamento das redes sociais. Parecemos o Chamberlain, a entregar os Sudetas aos nazis.
A par disto, há uma tentativa absolutamente inqualificável de relativizar a violência da extrema-direita, recorrendo a argumentos estapafúrdios que Carlos Moedas, cada vez mais risível, sintetizou há dias: “então e a violência de extrema-esquerda?”
A violência da extrema-esquerda?
Mas qual violência de extrema-esquerda?
O MRPP decidiu sair à rua para cumprir o desígnio de “matar os traidores”?
As FP25 regressaram?
Os antifas andam por aí a espancar pessoas de forma aleatória?
Não, não e não.
A única extrema a causar distúrbios violentos é a direita. E tem apoio no Parlamento e nas instituições.
A extrema-esquerda não constitui, em Portugal, ameaça a coisa nenhuma. Mas alguma direita, moderada ou liberal, que não percebe que é o próximo alvo da extrema, insiste em alinhar na narrativa dos populistas.
E não foi apenas Carlos Moedas. Miguel Morgado e o ministro Leitão Amaro também ajudaram à festa. Cavam a sua sepultura e serão engolidos pelo CH como os seus pares franceses foram engolidos por Le Pen.
Porque, entre o original e a cópia, a escolha é sempre a mesma.
Sempre.
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De facto, André Ventura tem razão: Portugal tem um problema de segurança.
Quando a extrema-direita se mobiliza para hostilizar comunidades imigrantes, ameaça a integridade das mulheres e defende abertamente que lhes seja tirado o direito de voto, espanca actores à porta de teatros e agride voluntários de instituições de caridade que distribuem comida aos mais pobres, estamos perante a mais alarmante ameaça à segurança pública desde o início dos anos 80, quando os movimentos de extrema-esquerda e extrema-direita do pós-25 de Abril foram finalmente extintos.
Uma ameaça que, recordemo-nos, foi recentemente censurada do relatório do RASI, porque, para este governo, a violência da extrema-direita não constitui uma ameaça. Luís Montenegro deve uma explicação ao país. Sob pena de se tornar cúmplice desta vergonha.
Esta ameaça, que é existencial, não se contém com detenções que duram algumas horas.
Resolve-se com penas efectivas que retirem os delinquentes violentos das ruas, das redes e das sedes de certos partidos.
Eis o nosso problema de segurança: gangues de fascistas e nazis que sentem a sua violência legitimada por um conjunto de populistas eleitos que se dedicam diariamente a normalizar o ódio e a selvajaria.
Sim, esses mesmos que vocês estão a pensar.
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Não deixa de ser irónico que, no dia em que se celebrou não apenas Portugal, mas também Camões, um grupo de teatro que interpretava a obra do icónico poeta tenha sido alvo de agressões por parte de alegados patriotas que não respeitam a cultura do seu país, apesar de viverem para uma guerra cultural importada que, na verdade, não passa de uma fachada para o seu verdadeiro intuito: semear o ódio, provocar a destruição e usurpar a nação para impor o autoritarismo. Estão-se nas tintas para a nação, para a cultura e para a história de Portugal.
E isto aconteceu, não por acaso, 30 anos após a morte de Alcindo Monteiro, às mãos de criminosos violentos que, aparentemente, continuam a causar distúrbios.
Que pertencem a uma quadrilha nazi considerada organização terrorista em países como o UK e o Canadá.
Que tem historial de perturbação da ordem pública e de crimes violentos.
Só há um lugar para estas pessoas e esse lugar é a prisão.
E o silêncio ou declarações tímidas de Ventura e da sua entourage sobre estes casos dizem-nos tudo o que precisamos de saber sobre a instrumentalização diária que fazem do tema da segurança.
Entretanto, do outro lado do Atlântico, um dos grandes heróis do Chega, Donald Trump, segue imparável com a Putinização dos Estados Unidos da América.
Só cai quem quer.