Autárquicas 2025
Opinião: Crónica da queda anunciada do regime
“A confirmar-se esta previsão, estaremos perante o fim da maioria que governou o concelho da Trofa de forma absoluta e o início de uma nova era na Assembleia Municipal (AM), na qual a imposição de políticas e orçamentos será substituída pela necessidade permanente de negociação”

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É expectável, mas não garantido, que Domingo se revele um dia histórico para o poder local trofense. A confirmar-se esta previsão, estaremos perante o fim da maioria que governou o concelho da Trofa de forma absoluta e o início de uma nova era na Assembleia Municipal (AM), na qual a imposição de políticas e orçamentos será substituída pela necessidade permanente de negociação, e que passará a ter pelo menos 4 grupos parlamentares, com a possibilidade de chegar aos 5, caso a IL atinja o resultado mais ou menos previsível de eleger um deputado municipal.
A guerra civil iniciada no seio do PSD, precipitada pela decisão unilateral do então autarca, Sérgio Humberto, que escolheu trocar o lugar para o qual foi eleito pelos trofenses pelo exílio dourado de Bruxelas, dividiu um eleitorado que poderia facilmente dar nova vitória à coligação PSD/CDS-PP., e abriu fissuras que, com as actuais lideranças, tornarão muito difíceis os entendimentos entre António Azevedo e Sérgio Araújo.
Aliás, a única opção que a coligação Unidos pela Trofa parece ter, no cenário actual, para lhe dar suporte na autarquia ou na AM, é o CH. A probabilidade de entendimentos com as candidaturas A Trofa é de Todos e Trofa em Primeiro é muito baixa, perto de zero. Ganhar eleições, aparentemente, não mais será suficiente. Serão precisos acordos pós-eleitorais para que a Trofa não caia na ingovernabilidade.
As mudanças expectáveis terão impactos e consequências no dia-a-dia da autarquia. Terão impacto no poder que algumas pessoas tinham sobre o emprego, os negócios públicos e a gestão diária do concelho. Terão impacto na vida das clientelas partidárias que se instalaram no aparelho da administração pública local. Terão impacto em toda a linha.
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Achei, inicialmente, que, mesmo com a cisão, a coligação Unidos pela Trofa ganharia com relativa facilidade. Mas, com o passar do tempo, foi ficando claro que não seriam favas contadas. Que António Azevedo tem mais força e influência do que se poderia inicialmente julgar.
Que Amadeu Dias se apresenta com um projecto claro e estruturado, tendo protagonizado, a meu ver, uma campanha mais bem organizada do PS Trofa em eleições autárquicas.
E que a coligação Unidos pela Trofa tem receio do resultado, a ponto de se ver na situação de ter que recorrer à imagem de Sérgio Humberto, que não é candidato, havendo mais destaque para o ex-autarca que nos trocou pela carreira em Bruxelas do que para qualquer candidato a vereador da coligação. Nunca um mandatário teve tanto protagonismo. E percebe-se porquê.
Acresce que muitos eleitores de direita, não necessariamente militantes, não compreenderam a forma como um pequeno grupo de militantes do PSD decidiu trocar a experiência e provas dadas de António Azevedo por alguém que não tem um décimo do currículo do professor. E o efeito na opinião pública pareceu-me evidente, a julgar pelo que ouço e leio por aí: Sérgio Araújo representa a manutenção do status quo, ao passo que António Azevedo representa aqueles que não dependem da política para pagar contas e se recusam a receber instruções provenientes de um gabinete no Parlamento Europeu. Parece-me fácil perceber qual dos dois está mais bem posicionado para recolher mais apoio popular.
Se somarmos a isto a dispersão de votos à direita, com IL e CH à bica para subtrair eleitorado liberal e ultraconservador que até então votaria Unidos pela Trofa, o problema agrava-se ainda mais.
Mas não acaba aqui.
Trazer Luís Montenegro ao maior comício da coligação, após tudo o que aconteceu com o escândalo Spinumviva, parece-me um tremendo tiro no pé. Ao nível da vinda de Sócrates à campanha do PS em 2009. Quando o poder se prolonga por tempo demais, o risco de falta de noção aumenta. Poderá ter sido esse o caso.
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O PS, partido-líder da coligação Trofa em Primeiro, fez aquela que considero ter sido a sua melhor campanha desde que acompanho eleições na Trofa, algo que faço com alguma atenção desde 2009. E nem nesse ano, em que o PS ganhou as eleições, me parece ter montado uma campanha tão consistente. Aliás, sou da opinião, bastante partilhada por muitos dos meus conterrâneos, da esquerda à direita, de que não foi o PS que ganhou as eleições. Foi o PSD que as perdeu.
Mas fazer uma boa campanha não chega para ganhar eleições. E se é verdade que o PS pode vencê-las, e alargar o leque de freguesias sob a sua gestão, não é menos verdade que, desde 2013, os resultados do partido caíram a pique, restando apenas o bastião do Coronado. Bastião esse que, com a saída de José Ferreira, que atingiu o limite de mandatos, volta a estar em disputa aberta, pese embora me pareça que a dispersão de votos à direita acabe por beneficiar os socialistas.
Se vencer as eleições, espero que Amadeu Dias tenha a coragem de fazer algo que se impõe: uma auditoria externa às contas do município, factura a factura, ajuste directo a ajuste directo, para que não restem dúvidas sobre os muitos casos que ensombraram os anos do humbertismo. Os trofenses têm o direito de saber como foi gerido o seu dinheiro nos últimos 12 anos. E, se isso vier a acontecer, suspeito que teremos algumas surpresas.
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Importa sublinhar algo óbvio: se a coligação Unidos pela Trofa não ganhar estas eleições, apesar de ter clara vantagem e de partir da pole position, o culpado pela derrota tem um nome: Sérgio Humberto.
Foi Sérgio Humberto que deixou o mandato a meio. Que trocou a Trofa por um salário principesco, mostrando que o orgulho trofense acaba onde começam os vencimentos de 5 dígitos. Foi a sua ala que impôs Sérgio Araújo ao PSD, quando António Azevedo é, a todos os níveis, mais competente, mais bem preparado e mais experiente. António Azevedo que, recorde-se, era ampla e constantemente elogiado por Sérgio Humberto e respectiva entourage, por ser o artífice das contas equilibradas. O mesmo António Azevedo que geria a autarquia enquanto Sérgio Humberto fazia política na rua ou andava nas suas lides partidárias, percebe-se agora bem porquê. O António Azevedo que foi professor, geriu a junta de Santiago de Bougado e credibilizou a candidatura de Sérgio Humberto em 2013, quando ainda poucos sabiam quem ele era.
Acontece que, com António Azevedo, aconteceu o mesmo que a outros, como o Clube Slotcar da Trofa, o autarca Luís Paulo ou o povo de Covelas: quando deixaram de ser úteis, foram descartados. Sorte do povo de Covelas, o embuste do aterro foi descoberto a tempo.
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A eleição do próximo Domingo é, de longe, a mais imprevisível de sempre. E cada voto vai contar.
O seu também. Exerça o seu direito.
Vote.
Porque, no dia 13 de Outubro, próxima Segunda-feira, vai acordar num concelho novo, politicamente falando. Não fique em casa.