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Crónicas e opinião

“Economia do ano” – Entre o brilho conjuntural e a estagnação estrutural

“Importa ainda sublinhar um ponto decisivo: este reconhecimento resulta mais da debilidade conjuntural de várias economias europeias do que de méritos próprios. “

Diamantino Costa

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A distinção atribuída pela The Economist, que identifica Portugal como a “economia do ano”, é positiva e merece ser reconhecida. É obvio que é melhor ser reconhecida como “economia do ano” do que o contrário. Contudo, a análise rigorosa dos indicadores utilizados pela revista demonstra que este resultado é essencialmente conjuntural: um crescimento do PIB ligeiramente acima da média europeia, uma inflação estável e a valorização de um mercado bolsista pequeno e altamente concentrado. São elementos relevantes, mas insuficientes para concluir que o país entrou num ciclo de crescimento sustentado.

Importa ainda sublinhar um ponto decisivo: este reconhecimento resulta mais da debilidade conjuntural de várias economias europeias do que de méritos próprios. Em muitos aspetos, trata-se menos de Portugal ter melhorado de forma estrutural e mais do facto de vários dos nossos concorrentes estarem temporariamente pior. A Zona Euro atravessou, em 2023-2024, um período de estagnação marcado por inflação elevada e contração industrial, especialmente na Alemanha. Assim, Portugal destacou-se num contexto em que o referencial se deslocou para baixo; não crescemos muito, os outros é que cresceram menos.

A experiência recente confirma que, sempre que as grandes economias europeias recuperam, retomam ritmos de crescimento superiores, enquanto Portugal regressa aos seus valores habituais — crescimentos anémicos e insuficientes para promover verdadeira convergência.

Nada indica, à luz dos dados atuais, que esta dinâmica tenha sido alterada. O país não ganhou novo impulso estrutural; beneficiou de circunstâncias favoráveis e de uma Europa em contraciclo. A conclusão é quase inelutável: estamos perante um episódio conjuntural, não perante uma mudança de paradigma.

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A esta leitura acresce a questão fundamental do Programa de Recuperação e Resiliência (PRR). Portugal recebeu um volume extraordinário de financiamento europeu, sem precedente desde a adesão às Comunidades Europeias. Seria legítimo esperar que tal injeção de recursos, orientada para modernização digital, transição energética e qualificação, se traduzisse num crescimento económico mais robusto. No entanto, tal não sucedeu: um crescimento em torno de 2 % num período de recursos excecionais revela atrasos na execução, dispersão de prioridades e insuficiente ligação entre investimento e reformas. O PRR deveria ter impulsionado o potencial económico; acabou, em larga medida, por apenas mitigar desequilíbrios e a ser usado para pagar despesa.

Também o mercado de capitais evidencia a divergência entre aparência e realidade. A valorização do PSI em 2024 foi significativa, mas resulta de um índice com menos de vinte empresas e fortemente concentrado em setores regulados. Um mercado tão reduzido pode subir muito em percentagem, mas permanece estruturalmente diminuto, incapaz de financiar o investimento empresarial de que o país necessita.

Finalmente, o Orçamento do Estado recentemente aprovado agrava as vulnerabilidades de médio prazo. A despesa pública deverá aumentar mais de 20 mil milhões de euros entre 2024 e 2026, sem que tal acréscimo esteja sustentado em ganhos de produtividade ou eficiência. Esta expansão da despesa corrente, conjugada com um crescimento económico fraco, cria inevitáveis tensões futuras: mais dívida ou mais impostos — ambos penalizadores da competitividade e do rendimento das famílias.

Por tudo isto, o reconhecimento internacional não deve ser confundido com progresso estrutural. Portugal beneficiou de uma conjuntura favorável e de uma Europa debilitada, mas não alterou os fatores que limitam o seu potencial. Quando as economias europeias recuperarem — como historicamente acontece — voltarão a crescer mais depressa do que nós, e Portugal retomará o seu padrão habitual de avanços curtos e estagnações prolongadas. Sem reformas profundas no mercado de capitais, no ambiente fiscal, na regulação e na eficiência do Estado, continuaremos a transformar oportunidades excecionais em resultados modestos

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